quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Don Ratón e sua Gangue

— Quero fugir em disparada do mau cheiro daquele lugar. São ratos, Madalena. Ratos famintos e raivosos.
— O rato raivoso roeu o resto do romã.
— Que diabos o romã tem a ver com a história, Madalena?
— José, já abriu romã pra ver? São pequenas bolinhas doces. Deméter comeu três e foi condenada a passar três meses no inferno a cada ano — pelo resto da sua vida. Por você, comeram mais do que três; pelo menos devoraram o romã inteiro. Isto é, se toda tua súplica não for produto de uma inata sede por drama, queda e nascimento.
— Madalena, você não faz o menor sentido. Não foi o romã que me comeram: foi a roupa, o reino e a terra. Estou nu da pior forma possível: sem majestade pra exibir o próprio brilho.
— José, você é que não entende nada. Passa o pão, por favor.
Ele passa sem nem olhar o que faz: íris concentrada na dor, mundo ao redor é pura insignificância.
— Escuta: se tua vida se basear no rato que tanto te dita e fascina, tudo que é fora do reino dele irá perder seu encanto. Quero dizer; o lixão dele não é todo lugar pra onde você vai.
— É sim. Estou condenado a cheirar o lixo revirado mesmo quando em casa. Não há como vencer.
— Então desiste! Don Ratón e sua gangue não procuram por sangue novo. Só querem mesmo é espantar as almas que são obrigadas a passar perto deles. Você é obrigado a isto?
— Não. Mas aí eu seria covarde. Imagina só, um ser humano como eu, fugindo da raia a troco de felicidade.
— A troco de quê?
— ... Felicidade.
Passando a manteiga no pão, Madalena exclama:
— José, desertar não é maravilhoso!?
José teve que consentir. Madalena sempre será mais incrível que ele.

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