sábado, 14 de fevereiro de 2015

Medo da Maturidade

Existem limitações, tão naturais quanto a normalidade da irritação por justamente estarmos presos nas circunstâncias limitadoras. Quero dizer, tudo é um grande processo.
Negar a morte é humano. Em seguida, aceitá-la, também. Após o período da intolerância, não vale a pena recorrer ao tempo e se arrepender por não cedo ter compreendido o inexorável. Faz parte de nossos corações nos afastarmos da verdade. 
Faz parte da vida não entendê-la. Faz parte da vida, negá-la. Faz parte da vida esmurrar ponta de faca. Tudo tão natural, típico como o tortuoso caminho que a rio faz para calmamente desaguar no oceano.
Há pouco entendi minhas limitações. Sou a onipotência viva, a crença na explosão do romantismo excêntrico. Mas tanta impetuosidade esbarra na descoberta do outro: tantos outros lutaram por minha causa, tantos outros choraram a desigualdade do mundo. Tantos outros transmutaram a rebeldia dos Xvi Anos a Mil. 
E perderam a batalha? Quiça devorados pelo mundo.
Mantenho a fé de muitas idéias, mas convicto de que a sapiência possui contornos, numa gradação cumulativa que deflagra na maturidade, numa ordem sábia — não autoritária — de enxergar o mundo.
Vacilo, tremo: serão os Xvi Anos a Mil enterrados num coração conservador? Tal ideia de Queda umedece, lentamente, o fogo da fé. A fé de um mundo não mundano. A fé de um mundo onde não seja a mais valia o motor do mesmo. Um planeta onde não haja detentores dos meios de produção senão os próprios trabalhadores, num orgânico e auto-gerado sistema. 
Eu prezo pelo cataclismo do capitalismo financeiro, um mal que mantém as malditas classes e a maldita miséria. São os velhos decrépitos que perpetuam a boa e velha politicagem. 
“Ok, você, pobre que votou no PT, parabéns. Mas e eu, como fico?”.
Ou então:
“Meu pai é dono de uma empresa. Você acha justo que aumente os impostos dele?”.
Ou melhor ainda:
“Tem uns caras que querem invadir prédios abandonados. Meu pai contratou uns caras para expulsá-los de lá. Ele comprou o terreno. É direito dele.”
Solipsismo, cobiça e o não desgarramento ao lucro. Soma-se a posse ao direito: eu trabalhei por isto. Eu batalhei por isto. É meu. Eu tenho total razão constitucional de manter minha propriedade.”
E agora, o discurso da democracia, a razão popular em proclamar e cobrar dos governantes o que quer falte para nós. Mas é claro que a contenção da violência é feita somente através da violência, porém, legitimizada. Compondo o esquema da coerção, arma-se o palco da hegemonia: “são eles os baderneiros e terroristas que afetam a boa ordem dos reclames do plim plim.”
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Tornei-me pálido quando li pela primeira vez, que o futuro da esquerda, é a direita envelhecida. 
Por ordem natural, encaminho-me cada vez mais ao mundo dos baderneiros. Isto me assusta. Futuramente, onde me encaixarei?
Lembro também das palavras que um dia, um adulto, vivído, inteligente e moderado me disse: “Quando a gente é jovem, pensa que a esquerda é boa, e a direita, má. Aí crescemos, e vemos que não é bem assim…”
Meu espírito torna-se túrvido: o que diabos ocorre quando crescemos? Como mudamos de lado tão rapidamente?
Há claro, meus salvadores. Minha única esperança de que não tornarei-me outro. Quem são eles? Os migrantes mexicanos, os nordestinos violentados, os judeus do holocausto, os armênios do genocídio Turco-otomano, as bravas feministas e o movimento LGBTS. Somos todos Galeanos. 
O frescor da luta sorri, convidando-me para o verdadeiro palco. O EZLN é uma força que me conduz. São eles que dizem ya basta! São eles que mostram-me a face não metamorfoseada, a esquerda não futuramente envelhecida e carcomida pelo tempo.
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Mas como introduzi assim o texto, retomo-o: conheço meus limites. Com tão pouca idade e tão pouca vida, necessito de cautela. A verdade não está plenamente em minhas palavras e leituras, e, com certeza, há algo da longa experiência que talvez bambeie minhas convicções. 
Resumo meu drama: crescer é mudar de lado, ou compreender algo que naturalmente se despertará com a maturidade?
Raramente cito meu pai em meus textos, mas agora necessito desta figura, quando me disse que existem coisas, coisas mesmo, sem pavoneamentos, incapazes de um cérebro jovem compreender.
A histórica luta da desavença entre o novo e o velho. A raiva do novo, e a dureza do velho. A imaturidade do novo, e a firmeza do velho.
Juro por Deus. Os que somente me salvam são os adultos que estão ao meu lado. Os adultos parcos. Os adultos que carregam minha esperança, tão inocente e jovem, de que a autoridade sábia e misteriosa dos anciãos é erro, fruto da interpretação arcaica de um mundo transigente, dinâmico e sofrido.
Aos professores de literatura, de filosofia, de sociologia e de história: vocês me fazem novo, formaram minha novidade, e a regulam para vencer o antiquado. Vocês são a prova de que os anciãos sabem mais, mas não sabem de tudo, e que olha só: também podem estar errados.

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