sábado, 14 de fevereiro de 2015

Noite na Paulista

Olhou para o ônibus e se jogou. Sua imaginação o levou ao hospital, onde sumiu em meio ao branco da medicina.
Paredes brancas, jalecos brancos. Tudo claro, vazio. De alma colorida, em direção ao nada.
Sua alucinação durou alguns segundos, e então foi transportada de volta para a São Paulo con(t)urbada. 
Luzes carros noite fumaça piercings homossexualidade. 
Lembrou que pensa, que lembra, que enxerga, que é. Tentou cantar, mas o esquecimento da letra o irritava. Resolveu observar.
Absorver também, embora não soubesse o que seria isso. 
Porque absorver é apropriar. 
Apropriar é tomar para si.
O que se apropria? Conteúdos marcantes? Luzes externas extravagantes? O que excita?
Não se absorve; se entra em contato com o meio.
Pausa. Observe o pequeno meteoro de dentro dos olhos dela. Sua pupila dilatada é consequência do bagulho, baseado, ópio moderno. Seu sistema nervoso simpático expande seu corpo. A névoa flutua em frente aos seus olhos.
Na minha língua, “olho” é “skápt”. “Yust skápt” significa “seu olho”. Yust skápt entrava em comoção com o ambiente. Não absorvia, não transportava. Apenas tremeluzia como o mar.
Lados não mais existiam. Fora e dentro também não. Tudo é um eterno agrupamento. Seus olhos grudaram no ambiente, parasitava o mundo. Ela e ele, uma pessoa só.
Luzes carros noite fumaça piercings homossexualidade. 
Fugia do que? 
Observava as pessoas. Os jovens. Os estilos.
Naquele processo de absorção entendia como odiava o mundo. Ridicularizava-o até as últimas consequências. E ao passar perto das pessoas, cantava “people, people!”.
Não, não era poesia aflorada: era ódio. Inventava nomes, personalidades, ironias. Por trás do camaleão, habitava o Napoleão em desejo. E por trás do narcisismo, se escondia algo mais forte: solidão.
Não era “people, people”; era um apelo.
Mas escureceu, e ele dormiu. Ela dormiu também.

Nenhum comentário:

Postar um comentário